domingo, 12 de outubro de 2014

O Campeche em imagens























Todos os dias eles se encontravam pela praia. Cada um com sua máquina fotográfica, capturando alguma beleza da praia. A vida animal, a areia, o nascer do sol, os pescadores, os surfistas. Madrugadores, eles iam buscar a melhor luz, já que a fotografia nada mais é que isso: o escrever com a luz. Depois, no fim do dia, lá estavam de novo, procurando um ângulo, uma réstia de luz. E nesse trabalho diário, cada um ia acumulando pequenos instantes dessa vida bonita que se expressa na praia do Campeche. Os encontros diários propiciaram o conhecimento e dali ia também nascendo a amizade, a troca, a comunhão.

Um dia, Milton Ostetto se deu conta que estava com o HD cheio de imagens da praia, e certamente seus companheiros e companheiras de caça à beleza também. Então, teve a ideia de oferecer esses olhares à comunidade, numa exposição. O primeiro pensamento foi a canoa de pesca do Getúlio, espaço cultural que já abriga o jogo da Capoeira e o curso de Música. Lá se foi buscar apoio. Chegou numa noite de aula e já foi recebido com música. A canoa, como sempre, de portas abertas para qualquer iniciativa que viesse ajudar a divulgar a cultura e a beleza do Campeche. Então, da conversa com seu Getúlio, a proposta de uma exposição de fotos no rancho vingou e tudo começou a ser preparado.

Foi assim que a tarde do dia 11 de outubro trouxe a comunidade para a beira da praia. Ver o Campeche, pelos olhos dos fotógrafos, é se assombrar com as maravilhas que esse lugar oferece todos os dias. Foi montado um espaço para a projeção das fotos. E assim, a percepção de  Milton Ostetto, Jacko Campeche, Ronaldo Andrade, Mara Freire, Hermes Daniel e Paulo Goeth chegou como um presente.

O fim de tarde ventoso prenunciava belezas. O som do berimbau deu o tom de um começo de festa, na malemolência da capoeira Angola, que já desde há um tempo vem se praticando no rancho. Sob o comando do mestre Luis os corpos se mexeram em dança/luta/brincadeira. Depois, mostrando que o Campeche é pródigo em acolher a diferença, o gaúcho Paulo Grilo contou sobre a guerra dos Farrapos e cantou músicas do Rio Grande. Para encerrar as apresentações artísticas os alunos do curso de música que existe no rancho desde há anos homenagearam os fotógrafos e a comunidade que se apertava no pequeno espaço fugindo do vento nordeste.

Por fim, veio a hora da fotografia. Num telão e sob o som de uma música quase celestial foram passando uma a uma as imagens congeladas de um lugar que é o objeto de amor de todos os que ali estavam, na quentura do rancho que, despido da canoa Glória, acolhia as gentes. Um desses momentos únicos que valem uma vida. Emocionada, do meu lado, uma mulher repetia, “que lugar lindo é esse nosso lugar”. E na tela, a luz ia desenhando imagens ora delicadas, ora fortes. O Campeche desnudado.

Terminada a projeção vieram as palmas, longas, demoradas, cheias de gratidão. Milton, Jacko, Ronaldo, Mara, Hermes e Paulo foram envolvidos por aquele calor ilhéu, profundo, que só se expressa quando realmente alguém o merece. Nos olhos de um e outro ainda brilhava uma lágrima. O Campeche é dádiva.

Para terminar, um outro momento único, típico desse rancho do seu Getúlio, que tanta beleza nos dá. O pão foi repartido e comido, como se faz com companheiros. Lá fora, o vento seguia rugindo, a lua escondida. Lá dentro, a comunhão de uma comunidade que ainda encontra tempo para se encontrar no cara-a-cara, repartindo a boa comida e essa deliciosa alegria de ser comum. Comunidade.

E a gente volta para casa com o coração  transbordando por poder fazer parte disso.

As fotos dos seis fotógrafos estão penduradas lá no rancho esperando que alguém as compre. Toda a renda da venda das fotos será revertida para o projeto de música.


Lá fora, a canoa Glória espera, na sua dureza de madeira. E a lua, finalmente sai. O Campeche brilha ao som dos risos das gentes... A praia rumoreja...